Metal Reunion Zine

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segunda-feira, 26 de setembro de 2022

ARQUIVOS EXPLÍCITOS #16 - Contos e crônicas da opera Rock do terror cotidiano.

 

A margem da margem

Por Fabio da Silva Barbosa

 Passava pelas ruas promovendo contorções faciais nos que detectavam sua presença. Seu cheiro empesteava até a esquina. O corpo era um conjunto defeituoso que trazia desprazer aos que avistavam seu rastejar moribundo. É impossível esperar que alguém se aproxime para dar afeto, abraço ou beijo. Apenas lançavam coisas em sua direção aos berros de “Sai daqui, coisa imunda!”. O nojo transbordava nos olhares que fuzilavam seu desfile asqueroso. Seres limpos e impiedosos viravam o rosto com ódio por constatar que ainda estava vivo e entre eles. Bons cristãos oravam por seu desaparecimento imediato. Sua permanência era o maior dos insultos. Para que tanta insistência em incomodar com seu podre viver? Mas isso não era voluntário. Não tinha forças para abreviar o constante sofrer. A morte rondava aquele escombro ambulante, mas ia se apoderando lentamente da carniça viva. Não havia pressa na deterioração das chagas purulentas. O vômito seco na barba, a corcunda disforme, os membros atrofiados. Uma ode a tristeza e ao desamparo. Desprovido do que quer que seja. Não tinha o mínimo. Não tinha o básico. Era o próprio não tinha. Escolha... Desconhecia o termo... O que tinha era apenas o que ninguém queria ter. Feridas por toda a parte, pestes e  parasitas. Agora pega um punhado de comida azeda e empurra garganta abaixo. Cagalhões fétidos desprendem automaticamente de seu cu, seguidos por um jato de diarréia e sangue. O odor só piora. Os olhos esbugalhados, com remelas secas enfeitando o entorno, não viam mais nada ao redor. Estava fechado em sua própria enfermidade. Não viu os meninos que passaram correndo e atiraram pedras. Brincadeiras cruéis que aumentariam o sofrer se ainda entendesse os acontecimentos. Para ele, nada que estivesse fora existia. Apenas o caótico universo interior em ruínas. Talvez fosse melhor assim. 

Talvez.     

Até a próxima!

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