Outro Navalha na Carne Extra, que escrevi, engavetei e quase não posto aqui. Mas...
Temos também parlamentares brasileiros conseguindo visibilidade internacional e causando constrangimento para o Brasil, escancarando que políticos brasileiros são pessoas perigosas. Sabemos que não são todos que são babacas assim, pois mesmo eu tendo reticências pesadas por nossos políticos, sei que tem muita gente que pelo menos tenta trabalhar para seus eleitores de forma justa e republicana, sim. Mas não sou partidário. Só vejo quem recebe verbas públicas para trabalhar para o povo, mas trabalha apenas para seus interesses particulares.
Ah! Temos uma deputada federal presa em presídio de segurança máxima na Itália, figura da extrema direita, que fugiu do Brasil usando a mesma rota que narcotraficantes utilizam para escapar da justiça brasileira. Ela foi condenada por usar um hacker para invadir o sistema CCJ e inclusive ter emitido um mandato de prisão contra um ministro da Suprema Corte brasileira — e, pasme, um documento emitido por ele mesmo para prendê-lo (risos). Criativa e debochada, e tenho plena certeza, que esse episódio vai dar trabalho para os professores de história do tal Brasil do futuro. Uma postura tão ridícula quanto um meme besta de redes sociais. Ou melhor, um meme pronto, que escancara: a direita brasileira é a cara de seus eleitores, burros, corruptos, preconceituosos e inaptos.
Além disso, temos um deputado federal licenciado, que, em setembro, já faltou ao trabalho mais do que o permitido pelo regimento interno da Câmara, mas ainda assim recebe vencimentos pagos com dinheiro público. E sabe o que esse sujeito faz na América? Articula sanções econômicas contra o Brasil, colocando em risco milhares de empregos de trabalhadores brasileiros, muitos deles provavelmente eleitores que votaram nele — e, curiosamente, ele não foi cassado pelo Congresso. E em outubro, o conselho de ética da Câmara dos Deputados, arquivou o processo de cassação desse sujeito, deixando claro novamente, que a vontade deles é a que vale. Foda-se o povo! Fodam-se os eleitores! Né!?
Caminhamos até aqui, setembro de 2025, e vimos Bolsonaro ser julgado e condenado por alguns crimes cometidos este ano — digo alguns, porque a mesma extrema direita que brada slogans fascistas como “Deus, Pátria e Família” conseguiu enterrar o relatório da CPMI da Covid, que listava outros tantos crimes do ex-presidente e listava outros tantos cúmplices que estão soltos, seja em púlpitos de igrejas neopentecostais ou legislando em casas parlamentares. Uma CPMI como tantas CPIs e CPMIs brasileiras, que foi parar nas gavetas do esquecimento, passando pano político parcial que serve para blindar criminosos e corruptos, e já faz parte do cotidiano politico da terra da banana.
Mas durante o julgamento que condenou o ex-mandatário a 27 anos e 3 meses, houve um micro evento relevante, produzido por um dos ministros da primeira turma do STF que julgava o golpista e seus poderosos cúmplices.
Por isso, resolvi não retomar a coluna, mas fazer apenas esta postagem para registrar minhas impressões assistindo ao julgamento e destacar estes pontos que mostram, sem rodeios, como a extrema direita brasileira está cada vez mais alinhada com o totalitarismo que cresce pelo mundo, principalmente em países como os Estados Unidos — com Trump novamente presidente, mais furioso do que nunca — e em outros cantos da Europa, onde partidos fascistas e movimentos neonazistas se fortalecem e se tornam visíveis para todo o globo.
Mas sem delongas, vamos ao assunto do título.
Desde que assisti, durante longas horas, ao voto do ministro Luiz Fux — totalmente dedicado à absolvição de Bolsonaro e de seus cúmplices no julgamento da trama golpista que pretendia rasgar a Constituição, manter o ex-presidente no poder e invalidar as eleições de 2018 — comecei a refletir sobre a democracia. Claro, nela, opiniões divergentes fazem parte do “cardápio democrático”, mas também pensei em outras questões, algumas bem atuais, outras antigas, mas que se encaixam perfeitamente na lógica torta de nossa realidade política e institucional.
O que me chamou atenção não foi apenas o conteúdo do voto, mas a encenação: quase treze horas para dizer o que poderia ter sido resumido em poucos minutos. Afinal, o óbvio não exige maratonas oratórias. A extensão excessiva do discurso só denunciava o esforço do próprio ministro em construir uma muralha de justificativas, uma retórica rebuscada para dar verniz jurídico a uma decisão que, no fundo, soava como um recado político.
É impossível ignorar o contexto. As relações diplomáticas entre Brasil e Israel estão deterioradas, sobretudo após o presidente Lula, com razão, chamar de genocídio a ofensiva israelense que massacra mulheres e crianças palestinas em Gaza, além de ter apoiado ações internacionais contra Tel Aviv. Isso trouxe a inevitável reação: retirada de embaixadores, tensões diplomáticas, notas de repúdio e, principalmente, a fúria da comunidade judaica brasileira — rica, influente, declaradamente bolsonarista desde 2018 e até hoje alinhada ao ex-presidente.
Em meio a essa discussão sobre parcialidade e privilégios, vale lembrar um episódio revelado em 2018 pelo Congresso em Foco: a filha do ministro, mesmo possuindo dois apartamentos no Leblon, bairro nobre do Rio de Janeiro, recebia auxílio-moradia mensal no valor de R$ 4,3 mil. O caso, que à época gerou forte indignação pública, ilustra bem a lógica de benefícios acumulados mesmo quando não há real necessidade, reforçando a percepção de que a toga se protege em círculos de conveniência.
Ora, Bolsonaro sempre foi o candidato preferido desses setores que misturam fé política com devoção ao Estado de Israel. Não por acaso, o bolsonarismo evangélico também se ajoelha diante dessa bandeira, ainda que Israel não seja uma nação cristã. E se Bolsonaro tivesse sido bem-sucedido em seu projeto golpista, não restam dúvidas: ele se alinharia irrestritamente ao governo israelense, independentemente de quantas mulheres e crianças desarmadas estivessem sendo exterminadas em Gaza.
Nesse tabuleiro, entra a figura de Luiz Fux. O único ministro descendente de judeus da Suprema Corte. Um magistrado que, além de exposto às pressões diplomáticas internacionais — como as ameaças de sanções pessoais vindas dos EUA, perda de visto ou até a famigerada Lei Magnitsky, que Trump prometeu usar contra ministros brasileiros — também carrega a sombra do julgamento interno de sua própria comunidade. Votar pela condenação de Bolsonaro e seus cúmplices significaria contrariar a ala mais ruidosa e influente da comunidade judaica brasileira, já ressentida com Lula e cada vez mais abraçada ao que resta do bolsonarismo.
Não se trata de simplificar sua decisão à religião que professa, mas de reconhecer que, somadas às suas ligações patrimoniais e interesses internacionais — investimentos, viagens frequentes, dependências que ainda precisam ser esclarecidas — havia muito a perder em um voto condenatório. O peso de sanções externas, a ameaça de retaliações simbólicas ou econômicas e a pressão comunitária criaram um ambiente em que sua imparcialidade, no mínimo, fica sob suspeita.
O resultado foi um voto de treze horas: não uma demonstração de erudição jurídica, mas a confissão involuntária de que era preciso justificar o injustificável. Filosofia, citações e hermetismos serviram de cortina de fumaça para encobrir a realidade cristalina: o ministro não julgava apenas Bolsonaro; julgava também o destino de suas relações, seus interesses e sua própria posição dentro de um cenário explosivo que unia diplomacia, religião, poder econômico e sobrevivência pessoal.
Assim, a democracia brasileira não foi salva por esse voto, mas manchada. Porque quando a balança da Justiça se curva às conveniências externas e internas, quando um magistrado transforma o tribunal em palco de autopreservação, a mensagem transmitida é inequívoca: a lei é maleável, a toga é negociável e a imparcialidade não passa de uma ficção útil para discursos intermináveis.
No fim, Fux pode até acreditar que defendeu a ordem jurídica. Mas o que muitos enxergaram, e com razão, foi outra coisa: um ministro preocupado mais em blindar-se de sanções e pressões do que em cumprir o papel de guardião da Constituição. E quando a toga treme diante de pressões políticas, diplomáticas e comunitárias, quem realmente sofre é a democracia — essa mesma que Bolsonaro tentou assassinar.
Por Alexandre Chakal
Em Setembro de 2025.








