Por Fabio da Silva Barbosa
Ele passava
olhando aquelas peças de carne penduradas nos ganchos e aspirava fundo para
captar toda a fragrância típica do açougue. Por Muito tempo perambulou daqui
para ali e dali para aqui, trocando de emprego mais vezes que trocava de cuecas.
Quase não trocava de cuecas. Nada fazia sentido. Mas agora tinha se encontrado.
Manusear toda aquela carne... Escolheu
uma das que estavam penduradas e começou a dançar. E cortar... Pegou a faca e
dava estocadas na peça. Começou a beijar a carne de forma voluptuosa.
-Mais que
merda é essa?
Ele virou a
cabeça para onde vinha o som. Quando o dono do açougue entrou em seu campo de
visão, sua expressão não mudou. Seus olhos demonstravam que ele já sabia onde
aquilo ia dar. Girou o corpo até ficar completamente de frente para o Seu
Aluízio.
- Algum
problema, Seu Aluízio?
- Como
assim se tem algum problema? Vamos já para o escritório!
- Mas...
- Vamos!
Não me faça perder tempo!
O
escritório era uma salinha que ficava nos fundos do açougue, Tão pequena que a
mesa com as duas cadeiras já tomavam quase todo o espaço. Era uma cadeira para
Seu Aluizio e outra para a pessoa com quem ia conversar. Conversar com mais de
um ao mesmo tempo não seria possível no escritório. Cada um sentou em seu
respectivo lugar.
- Olha
aqui, rapaz... Ninguém aquenta mais suas esquisitices. Seus colegas de
trabalham sempre te flagram em alguma situação estranha e eu mesmo já te peguei
algumas vezes em situações como a de hoje.
- Mas o que
eu fiz? Não estava acontecendo nada de mais.
- Olha,
moço... Se quer me fazer de bobo, não vou ficar aqui batendo pandeiro para
maluco dançar. Toma aqui quanto lhe devo. Pronto, ficamos quites. Ninguém deve
nada a ninguém.
- Na
verdade, se fosse com carteira assinada...
- Mas não
é. E se fosse, dava logo uma justa causa. Era só o que me faltava. Vai logo
antes que chame a patrulha que faz a segurança dessa área. Tá chegando o dia de
pegarem a carne do churrasco e vão querer mostrar serviço pro churrasco ser do
jeito.
...
Ele não
morava longe e voltou caminhando. Pensava em quanto tempo tinha demorado para
conseguir um trabalho que casasse tão bem com seu perfil. Tentava se consolar
pensando em quanto açougue tinha nas redondezas. Afinal, tinha aprendido o
ofício com riqueza de detalhes. Qualquer um que o contratasse iria ficar
satisfeito.
Subiu as
escadas de madeira do prédio. Escadas velhas, daquelas que rangem e estalam,
parecendo que estão gemendo e chorando, que vão desabar a qualquer momento. O
elevador já estava há muito tempo quebrado. Os insetos se esgueiravam por todas
as partes.
Entrou
silenciosamente no apartamento, com cuidado para os vizinhos não ouvirem e
aproveitarem pra reclamar novamente do cheiro que saía de seu apartamento. Ao
entrar, foi direto para o quarto e passou em revista cada cadáver pendurado no
gancho, como as peças de carne do açougue. Cada gancho, além do corpo, tinha
uma plaquinha com o nome deste. Um gancho estava vazio. Ele foi até a
escrivaninha e fez uma plaquinha com um nome. Prendeu-a no gancho vazio. Estava
escrito Aluízio.
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