Metal Reunion Zine

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domingo, 24 de dezembro de 2023

ARQUIVOS EXPLÍCITOS - Contos e crônicas da ópera rock do terror cotidiano - Segunda Temporada 2023 - #19

 

Sob os cuidados do Doutor V

Pro Fabio da Silva Barbosa

 

Doutor V era conhecido por seu comportamento diferente. Andava mudo pelos corredores do hospital e, sempre que era cumprimentado, respondia com um grunhido. Gostava de perambular pelas alas mais abandonadas, onde podia fumar com pouco risco de cruzar com alguém. Mas sabe como é a rotina hospitalar. Mesmo em um hospital grande, como aquele, tem sempre alguém que vê o que acontece. Sua dependência do cigarro era tão intensa, que alguns garantiam que ele saía com a roupa do centro cirúrgico para fumar e voltava para continuar a cirurgia com a mesma vestimenta, ignorando completamente o protocolo. Existiam relatos que pior que sua compulsão tabagista, só mesmo o alcoolismo. As pessoas relacionavam o seu hábito de pouco falar, com sua rotina alcoólica. Assim, não parava para interagir com os demais funcionários porque não queria que sentissem o cheiro que exalava. Mas o que derrubou Doutor V foi outro costume. Ele era o cirurgião ortopedista do hospital naquele plantão e noventa por cento das cirurgias que aconteciam sob sua responsabilidade eram de amputação. Fiquei até curioso em saber o que faziam com tantas partes de membros sendo descartadas. Ainda não sei. Será que cremavam? Contudo teve o dia em que um camarada estava andando de moto e existia um galão no meio da estrada, com uma ponta retorcida para cima como uma barbatana de tubarão. Já era madrugada e a falta de iluminação camuflou a armadilha no meio do asfalto. A lasca do galão levantada entrou entre os dedos do pé direito, fazendo a abertura entre os dedos se expandir ate mais da metade do pé. Foi levado por uma ambulância até o hospital. Ao desembarcar na emergência, ainda sobre a maca, deu de cara com Doutor V que olhou bem o estado do pé, chegando com seu rosto muito perto. Grunhiu: “Abriu o pé igual a uma abóbora. Isso não tem jeito. Tem de arrancar logo. Leva para o centro cirúrgico”. O paciente seguiu pelo caminho gritando que não queria perder o pé. Chegando à sala de cirurgia, se apavorou ao ver os equipamentos que iam ser usados. Parecia uma bancada de serralheiro. Foi contido e anestesiado. Doutor V apareceu pronto para executar o serviço. Os olhos chegaram a encher de água quando viu a serra cirúrgica a espera para começar a funcionar. Adorava seu barulho.

... Ah... E como ele foi derrubado? Isso é outra história. Um dia, quem sabe, chego nessa parte.  

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