Iniciamos
hoje a segunda temporada de ARQUIVOS EXPLÍCITOS - Contos e crônicas da ópera
rock do terror cotidiano. Escolhi o dia primeiro de abril para iniciar esta segunda
temporada por ser um dia lembrado por muitos como dedicado a mentira, a
zombaria, ao escárnio, ao deboche, brincadeiras de mau gosto... Enfim... Foi só
algo que passou por minha cabeça e que, mesmo não fazendo o menor sentido,
acabou sendo. Tá aí o primeiro episódio desta nova etapa. Quantos episódios
serão? O mesmo número que o anterior? Seguirá na mesma linha? Quando terminar
esta, terão outras temporadas? De nada disso sei. Nem sei se continuarei a
respirar amanhã, quanto mais estes detalhes. O que posso adiantar é que cada
temporada continuará separando os episódios por quinzenas enquanto durar. Ou
seja... A cada quinze dias teremos novas desventuras dos seres desencantados
que povoam a terra. Também manterei a metodologia de escrever de uma só vez,
sem ficar relendo ou fazendo ajustes e correções. Mais do que isso não
arriscaria afirmar.
Fabio
da Silva Barbosa
Memórias e esquecimentos
Por
Fabio da Silva Barbosa
Era hábito comum indivíduos que nunca se viram dividir
as poucas mesas que entulhavam o pequeno salão. Ficava em um local de passagem
no centro da cidade. Pessoas de todos os tipos e todas as partes passavam por
ali. As mais diferentes filosofias e estilos de vida repartiam o espaço
diminuto. A fumaça dificultava a respiração em dias de lotação máxima. Naquele
calor infernal então... Ele chegou perguntando se podia ocupar a cadeira do
lado oposto da mesa onde eu estava. Perguntou já sentando, se jogando por cima
de tudo. Apoiou o copo de cachaça quase entornando o líquido amarelado. Com certeza
ele havia escolhido uma da prateleira de conservas.
- Acho que já te vi por aqui. – Falou logo que
conseguiu se ajeitar na cadeira.
- Vez por outra passo pelo pedaço e dou uma parada. –
Respondi sem muito entusiasmo.
- Frequento esta zona há mais de trinta anos. Na época
boa essa rua era só bar. Bar, puteiros e produtos roubados. Tinha a rapaziada
dos entorpecentes também. Falando em entorpecentes... Uma vez estava em um bar
que existia logo ali na esquina. O Cachorro Louco tava tocando com sua banda no
palquinho improvisado que ficava do lado do banheiro. Tocando era modo de
dizer. Era uma banda punk autêntica, de raiz... Radical mesmo! Barulho da porra!
O pessoal se matando de tanto agitar. Tava um calor tipo hoje. Fiquei pelo
balcão tomando uma. Daí veio um cara e encostou do meu lado. Achei que parecia
com aquele dos Stones. Como é o nome dele mesmo?
Nesse ponto já tinha fechado o livro que sorvia junto
da cerveja e prestava atenção em meu novo companheiro de prosa. Fiz um
movimento com os ombros demonstrando que não fazia a menor ideia de qual
integrante ele falava. Mas ele continuou sem se importar com isso.
- O sujeito era engraçado e ficamos por ali bebendo,
falando merda e vendo o show. Daqui a pouco ele foi ao banheiro e um conhecido
veio rápido em minha direção. Perguntou se eu sabia quem era aquele careta com
quem estava trocando ideias. Expliquei que tinha acabado de conhecer, mas
parecia boa gente. Então se fez a revelação. O figura era policial disfarçado e
eu ali, com os bolsos cheios de tóxicos.
Nesse ponto ele explodiu em uma estrondosa gargalhada
e quase virou a porra toda. Mas logo sua expressão mudou e voltou a ficar sério,
estudando meu rosto, esquadrinhando cada ruga. Não sabia muito bem o que fazer
e soltei um “E aí?”. Ele pareceu não perceber minha pergunta e emendou outro
caso.
- Ruim mesmo foi quando tomei um tiro no pé. Estava
ajudando o dono a fechar o bar...
- O da esquina?
- Que esquina, rapaz?
- O bar que você falou que era ali na esquina. Onde
rolou a história do policial.
- NNããããooo... Esse era mais pra cá. Do outro lado da
rua. – Deu outro gole na cachaça e continuou. – Daí um cara começou a se
encarnar em mim. Ensebando mesmo. Me pegou pra Cristo. Dei um chega pra lá
nele, mas isso só piorou a situação. Era um tipo cheio de problemas com a
polícia. Me entende? O corpo dele era todo costurado. Cheio de marcas de
facadas. Daí ele puxou a arma e deu um tiro no meu pé. Imagina isso? Sorte que
foi um tiro de vinte e dois. Daí foi aquela gritaria e o pessoal que me conhecia
intercedeu ao meu favor... Sei te dizer que sentei e fiquei alguns segundos
olhando pro meu pé. Aquilo não parecia nada bom. Quando levantei de novo a
cabeça, ele já tinha sumido. O dono bar pediu pra Cachorro Louco e Fiapo: “Leva
esse traste daqui. Não preciso de mais um baleado nesse bar. Carrega pra um
hospital”. E assim fizeram. Só que fomos andando. Imagina andando com um tiro
no pé. Ainda bem que era de vinte e dois. Quando avançamos uma quadra, o diabo
do cara saiu de trás da lixeira. Era uma lixeira daquelas grandes, sabe? Daí
ele veio com um pedaço de pau na minha direção. Fiapo pulou entre nós dois e
pediu calma. Mas como pedir calma prum demônio daqueles? O sujeito vinha em
minha direção como se fosse um trem. Sorte que Cachorro Louco viu aquele tijolo
no canto da calçada e acertou em cheio a cabeça do Satanás.
- E ele apagou?
- Vou te dizer que aquilo era bicho tão ruim que só
deu uma tonteada. Mas foi o que a gente precisava pra desaparecer da situação.
Nesse ponto levantou virando o que sobrou no copo.
Percebi que estava indo embora e perguntei seu nome. Ele respondeu e perguntou
o meu. Nos cumprimentamos e o vi sumindo, mergulhando na multidão.
Qual era o nome dele? Não lembro. Esqueci quase em
seguida.
Até a próxima!
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