Maurício Mendonça Júnior*
O Heavy-Metal possui uma conexão forte com o Inconsciente Coletivo e seus Arquétipos. O Inconsciente Coletivo, segundo Jung, é a "região" mais profunda da psiquê humana, a base genética, comum a todos os povos na História. Os Arquétipos são as formas que se destacam nessa base primordial. O herói, o grande sábio, deus, são exemplos disso e tais "figuras" apareceram de forma e conteúdo semelhantes em praticamente todas as culturas do globo, ainda que os povos nunca tenham se encontrado. O guerreiro histórico ou mitológico, o bardo, o viajante aventureiro, são exemplos de vida e todo jovem e/ou adulto que escuta esse estilo de música apresenta muito das características do herói: a força, a coragem, a lealdade, hombridade, criatividade, atitude e, infelizmente, às vezes, também o orgulho e o fim trágico, envolvendo drogas, álcool, violência, ou acidentes.
O Heavy-Metal é um estilo musical de expressão mundial que possui significado psicológico muito profundo. Toda a riqueza de variações sonoras, ideais e imagens que se encaixam na ideologia de contestação e libertação individual trazida pelo Rock, também funcionam como veículo de expressão da subjetividade e pode ser compreendida de modo mais amplo.
Em Psicologia Analítica, trabalha–se com conceitos como Sombra, Persona, Inconsciente Coletivo e Arquétipos.
Esta corrente psicológica, fundada pelo psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, no século XX, destaca a noção de que por trás da linguagem humana havia conteúdos profundos em forma simbólica e inconsciente. Através deles, era possível compreender e ajudar as pessoas em muitos aspectos, uma vez que o desenvolvimento psíquico se dá a partir da conscientização e integração dos conteúdos da alma e não da sua repressão.
Tudo isso pode ser percebido no Heavy-Metal.
A Sombra é uma dinâmica psíquica que se refere a tudo aquilo que o sujeito desconhece ou não aceita sobre ele mesmo. Tal dinâmica aparece em sonhos e na realidade de forma mais ou menos consciente e, principalmente, de modo inconsciente. No Heavy-Metal, tem um papel muito importante. Guerra, morte, sangue, demônios, violência social e doméstica, abuso sexual, esses e outros temas que geralmente são reprimidos pelas pessoas, ganham uma forma de expressão através da música.
Jung incentivava seus pacientes a buscarem uma forma de arte como complemento ao tratamento em psicoterapia. Ele próprio pintava e esculpia, porque uma vez que os conteúdos inconscientes ganham um espaço na vida real, vão sendo conscientizados e se promove uma espécie de higiene mental.
O "Headbanger", como é se define oficial e corretamente a pessoa que gosta deste estilo musical, foi caracterizado pela sociedade com diversos estereótipos ao longo do tempo. O mais famoso foi o de retardado mental, alienado, bobo, relaxado com a aparência. Isso começou com a dinâmica social de se eliminar o diferente e desconhecido. Em Psicologia, chamamos estereótipos de Persona, uma máscara que a sociedade e o indivíduo criam para um relacionamento superficial. A sociedade vê o indivíduo que se destaca, de uma forma ou de outra, como um "perturbador da ordem", aquele que representa o novo e ameaçador. A máscara serve para padronizar os sujeitos e formatar grupos na utópica busca da sociedade pelo padrão. Um bom exemplo é a perseguição de Roma aos cristãos, dos colonos estadunidenses aos índios, do nazismo aos judeus, entre outros.
Um jogo da Persona e Sombra. Acontece que o próprio sujeito faz uso da máscara como, por exemplo, quando é comunicativo e ativo no trabalho, mas calado e passivo em casa.
O Headbanger também faz uso disso e sua máscara, geralmente, é assustadora e contestadora. As fotos com cara de mal, o uso do chifre do diabo como símbolo das mãos, as roupas pesadas, cinturões de bala, braceletes com espinho, rostos cobertos de tinta imitando sangue, tudo isso é feito realmente para chocar. Apesar da Persona ser um importante mecanismo do convívio social, ao mesmo tempo, é um obstáculo ao desenvolvimento psíquico em determinado estágio, por alimentar a divisão psíquica.
A sociedade costuma suavizar a exigência pelas personas, conforme se desenvolve, abrindo espaço para o diferente.
Por trás dessa máscara hostil, o que se vê é um sujeito com necessidades de expressão e identificação de sua subjetividade. Os shows representam um momento de festa, de extravasar frustrações, de comemorar e gritar o ódio. Muitas bandas, como o Iron Maiden, definem a questão da sonoridade e de toda a temática pesada como um evento de libertação, onde ser agressivo não significa quebrar algo, ou agredir alguém verdadeiramente. O Headbanger não é habitualmente uma pessoa adepta da transgressão e da criminalidade, mas integra e não reprime os conteúdos sombrios do ser humano.
Obviamente, existem exceções, mas a sua conduta costuma ser regida por valores profundos, muitos já esquecidos.
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Psicologicamente, tudo isso que já foi expressão subjetiva de um povo inteiro, em determinada época, ainda tem uma importância muito grande para nós.
O Headbanger é famoso por ser ávido leitor, colecionador e conhecedor da História, Religiões, Ciência e Arte, bem como da própria música. Muitos deixam de se dedicar com ênfase ao estilo conforme vão envelhecendo, constituem família e carreira. Cortam o cabelo, mudam o visual predominantemente preto, se adaptando às exigências sociais e novas necessidades individuais. A maioria permanece fiel ao Metal, uns de forma mais branda, outros de modo mais intenso. Também se casam e constituem carreira, muitas delas de expressão mundial.
Jim Carrey, famoso ator de comédias como O Máscara, é um Headbanger e escuta as vertentes mais pesadas e brutais do estilo. A banda de Death-Metal, Cannibal Corpse, aparece no primeiro Ace Ventura a pedido seu. Isso porque no Heavy-Metal, idade significa aprimoramento, avanço, consolidação e não morte.
Até mesmo porque, para o Headbanger, o Heavy-Metal é um estilo de vida e, de certa forma, um mundo próprio. Nesse universo tão particular é possível expressar sua voz, sofrimento e alegria através da arte. Isso é tão importante para o indivíduo, quanto para a sociedade.
* Maurício Mendonça Júnior: Músico, bacharel em Psicologia e psicólogo (CRP: 08-14124).
Fonte
Bruna
Ilustrações
Pesquisa Music Reunion Prod's
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