Por Fabio da Silva Barbosa
Ajeitou-se
na cadeira, deu um leve giro para um lado e para outro, olhou o secretário e
quis saber:
-E o que
temos pra hoje?
O
secretário, com ar atrapalhado, abriu a agenda no dia correspondente e arrumou os
óculos no rosto.
- Boa
tarde, senhor. Aquele pastor que está vindo como candidato gostaria de saber os
termos para conseguir nosso apoio.
Ao ouvir o
secretário, explodiu em uma gargalhada tão forte que deu um pulo da cadeira.
- Tá de
sacanagem!? O que esse cara quer mais? Tem um monte de igreja nas mãos e ainda
quer nosso apoio!? Em cada igreja um monte de cérebro mole que parece massinha
de modelar. É só ele fazer ficar do jeito que quer. É canal de televisão,
jornal, programa de rádio... O sujeito tem tudo o que precisa. Queria eu ter o
que ele tem hoje. Principalmente o dinheiro. Além do dízimo, entra grana de
tudo o que é lado. As roupas que aquele povo usa é tudo confeccionado pela
igreja. Cada material ungido... Faz o seguinte... Marca uma reunião com ele pra
entendermos melhor.
Fez um
gesto com as mãos pedindo pela pauta seguinte. O secretário acabou de anotar
sobre a reunião e partiu para a próxima. Fez uma expressão como quem tinha lembrado
algo importante.
- Fizemos o
levantamento que o senhor pediu sobre aquelas mortes. Confirmou suas suspeitas.
Briga por causa de território.
O outro fez
ar interessado, ajeitou-se novamente na cadeira e olhou fixamente para o
secretário.
- Tráfico?
-
Maquininha de caça níquel.
- Mas isso
não tava com o jogo do bicho, porra? O que esses putos têm de ficar espalhando
presunto na minha área? Se eu soubesse que não iam conseguir manter a coisa em
ordem, dava pra milícia cuidar.
O
secretário já esperava aquela reação cheia de raiva. Trouxe logo a solução para
acalmar os ânimos do seu patrão que já estava de pé.
- Calma... Na
região é o jogo de bicho que controla as maquininhas e faz isso como ninguém. Se
tivéssemos deixado com a milícia estaríamos tendo problemas constantemente.
Sabemos como eles fazem as coisas. Foram só uns caras que resolveram colocar o
jogo por fora, mas já foram avisados. Entenderam bem o recado dos corpos e já
partiram dali.
O patrão
puxou a cadeira e voltou a sentar. Passou a mão nos braços dela e lembrou
quando a encomendou. Foi um dinheiro para conseguir fazê-la entrar.
- Se eles
já deram jeito, então tá tudo certo.
Ao ver o
gesto pedindo a próxima pauta, o secretário procurou rapidamente na agenda e se
localizou.
- Problemas
na prostituição. As meninas estão reclamando de um cara novo que apareceu na
praça. O sujeito rouba dinheiro delas e já quebrou o maxilar da Marli.
- E quem é
este merda?
O
secretário observou o ar de raiva na pergunta e disse que era um desconhecido
da área que estava morando em uns hotéis perto da rodoviária.
- E o Maurício
que cuida disso tá esperando...?
-Só eu lhe
comunicar e passar sua autorização.
Acabando de
falar, o secretário já via a mão fazendo o gesto. Olhou um pouco a face do
homem sentado a sua frente. Como ele era expressivo. A raiva em seu rosto foi
dando lugar a um ar entediado. Para não passar a impressão que estava
observando o chefe, fechou logo a agenda e anunciou que o próximo assunto era o
caso do preso que estava traficando no pavilhão sem repassar parte do lucro.
- Traz o
bicho.
O
secretário saiu e logo voltou. Enquanto isso, o patrão ficou brincando com uns
fios soltos no braço da cadeira. Atrás do secretário vieram dois homens carregando
um que parecia o verdadeiro resto de gente, o farrapo humano. Estava todo
arrebentado de tanto apanhar.
- E aí, meu
rapaz... O pessoal te explicou direitinho? Você entendeu como funciona aqui?
Posso acreditar em você ou preciso te matar?
O preso
balançou a cabeça afirmativamente, murmurando um “entendi” que repetiu algumas
vezes.
- Pronto.
Podem levar. A partir de agora ninguém encosta mais um dedo nele. Ele trabalha
pra gente.
Olhou para
o secretário com ar interrogativo e perguntou se tinha mais alguma coisa.
- Não,
senhor. Por hoje é só.
- Então é
isso. Avisa ao carcereiro que é dos nossos sobre a reunião com o Pastor. Ele
vai vir fora do horário de visita e precisamos de um lugar reservado.
- Sim,
senhor.
- E você tá
anotando essas porras nessa agenda daquele jeito que te falei? Tudo em código pra
ninguém entender?
- Sim,
senhor
- Então
vamos se preparar que tá quase na hora do banho de sol. Hoje quero ir pro pátio
com meu tênis novo. Pega ali pra mim.
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