O pernambucano Guga Burkhardt
começou a desenvolver seus dons artísticos muito cedo, influenciado pela sua
coleção de HQs, onde treinava, tentando copiar os traços dos grandes mestres
dos quadrinhos. Daí, foi lógico optar por cursar uma faculdade na área das
artes e se formou em Desenho e artes plásticas pela UFPE. A caneta
esferográfica foi sua primeira técnica aprimorada nos cadernos da escola e
depois começou a estudar diversas outras técnicas e materiais como óleo,
acrílica, pastel à óleo, lápis de cor e nankin.
Foi no traço do Bico de Pena, no contraste da luz e sombra, que ele
começou a criar as ilustrações que acompanham seu lado de zineiro. Em 1986
lançou o fanzine Acclamatur, especializado em música pesada, sempre com característica
de conter muito trabalho de ilustração em preto e branco.Participou de várias
exposições coletivas e individuais e ilustrou várias capas de CDs, camisa de
bandas e logos. Reforçando a forte influência da música na sua arte.
Atualmente está com a exposição
dos seus trabalhos relacionados ao Acclamatur e trabalhos encomendados por
diversas bandas e músicos, sobre o título “O Traço Hostil” uma alusão ao
significado do nome Acclamatur, que vem do latim e significa “Solta-se um grito
hostil”.
Matal Reunion Zine. De que forma a música influência sua arte?
Guga. Em todo momento que estou criando. Não consigo desenhar ou
pintar sem estar ouvindo algum som. Seja um som mais viajado como um
Progressivo, seja um Death Metal. O som cria, o som projeta imagens. Por isso
utilizo sempre música para criar.
Matal Reunion Zine. Uma boa parte dos seus trabalhos são em preto e branco,
nankin. Porque?
Guga. O nankin ou bico de pena, foi uma das primeiras artes que
comecei a utilizar, como é uma técnica trabalhosa, principalmente o pontilhismo, eao
memso tempo menos valorizada em termos de mercado, do que óleo ou acrílica, me
afastei uns anos do nankin e retornei
depois de fazer uma ilustração de uma mandala para a capa do cd
“Dançando aos Pés de Shiva” do violinista Sérgio Ferraz. Muito satisfeito com o
resultado comecei a desenvolver uma série que chamei de “Revoluções Circulares”
que depois virou uma exposição que circula até hoje.
Matal Reunion Zine. Por algumas temáticas nas suas ilustrações qual sua
posição com relação a crenças e religião?
Guga. Não sou materialista. Por alguma razão, talvez ancestral,
não consigo. Se você observar muitas das minhas obras são carregadas de
espiritualismo. Só não sou afeito as crenças organizadas, principalmente
criadas pelo homem que parece ser naturalmente corrupto e predatório. Ou seja,
as religiões são criadas pelo homem, portanto perigosas. Realmente tenho muita
mística envolvendo meus trabalhos e experiências extra-sensoriais e acho que
o sobrenatural é o natural que nos não
compreendemos ainda.
Matal Reunion Zine. E seu lado zineiro, como surgiu?
Guga. Bom, no inicio de 80, como o Metal tava em ebulição, o Thrash Metal, Death
Metal , Black Metal surgindo. Então, imagine que revolução estávamos vivendo! Não
podia deixar aquilo passar em branco. Tinha que registrar de algum jeito.
Decidi , junto com minha companheira lançarmos um zine. Mas claro que coloquei
meu lado artista de cara e resolvi não colocar foto de banda na capa. Esse era
quase o padrão dos zines na época. E criei a arte do demônio crucificado numa
cruz invertida pra ser polêmica mesmo.
No dia do lançamento e com o Black Metal surgindo, um cara me questionou sobre a capa. A resposta foi dentro
da proposta anárquica que o fanzine tem: “Eu crucifico quem eu quiser, o
demônio, Jesus cristo, religião, política. O zine é contra todo tipo de
manipulação, de regras”. Foi uma resposta ao vivo, na cara e saiu quase sem
pensar, porque essa era a verdade do zine. Sou puto com muitas regras.E se você
observar, o demônio está crucificado
numa cruz invertida, portanto não era uma cruz cristã. Essa imagem virou a logo do fanzine.
Matal Reunion Zine. Como manter um zine tanto tempo?
Guga. Na verdade, quebramos logo no inicio e só agora a poucos
anos reativei ele fisicamente. A comemoração dos 30 anos é de criação. E depois
disso, graças a internet, percebi que a cultura dos zines ainda se mantém em todas as
linguagens , não só de música. Tem até zinetecas como em Brasília, professores/Doutores
em universidades trabalhando com isso, como o grande Edgar Franco / Ciberpagé e
a Mestre Danielle Barros. Ou seja até no
meio tradicionalíssimo acadêmico os zines tem seu espaço.
Matal Reunion Zine. O que você acha das artes digitais?
Guga. Prefiro o orgânico, sou old school mesmo. Só acho que as
artes digitais tiram um pouco a característica do artista. Perde um pouco a
assinatura dele. Se você perceber, ficam muito parecidas, tem que ter muita
personalidade para ter seu traço reconhecido quando digital. Em cada traço
feito a mão, em cada erro, em cada
linha, o artista deixa um pouco da sua alma. Da sua energia. É essa a diferença
que eu acho da arte orgânica pra digital e felizmente parece que a primeira volta a ser valorizada.É o mesmo
movimento que está acontecendo com a volta do vinil.
Matal Reunion Zine. O que você estar preparando para comemorar os 30 anos?
Guga.Esse ano de 2016 é ano comemorativo. Lancei o primeiro zine
esse ano com CDs bônus do Tempestilence e Epoch Of Hate para os primeiros 30
exemplares. No próximo que devera sair agora em junho, haverá mais surpresas. E
também estou com a exposição “O Traço
Hostil” com meus trabalhos na área de Música. Não só nankin , mas alguns em
acrílica também. Muitos deles são os desenhos que ilustram o Acclamatur zine,
outros de camisas de bandas, logos, etc. A idéia é chegar em várias regiões do
Brasil, atrelada sempre a um show .
Matal Reunion Zine. Deixe aqui um salve de despedida para nosso leitor.
Guga. Quero aqui agradecer todo o apoio e reconhecimento ao meu
trabalho como artista visual e quero que as pessoas entendam que o Acclamatur
zine é uma das minhas expressões culturais, não tenho rabo preso com nada ou
ninguém, por isso não esperem de mim nada diferente do que plantei a 30 anos:
muita fúria misturada a ironia!
Entrevista por Chakal.
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